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Loja física, e-commerce? A disputa agora é pela renda do consumidor

Loja física, e-commerce? A disputa agora é pela renda do consumidor

Com o fim das restrições de circulação de pessoas, comércio de rua, shoppings, bares e restaurantes voltam em cena para tentar tirar ganhos do e-commerce

Há pouco tempo, o grande debate no setor do varejo era a disputa entre o físico e o on-line. Em seguida veio a conclusão de que um não vive sem o outro e a valorização do omnichannel.

Um ano e meio depois da pandemia que provocou uma revolução nos hábitos e na maneira de comprar, o que vem por aí no varejo neste final de ano?

Para quem estuda o consumo, empresários e economistas, com o fim das restrições para a circulação de pessoas, a disputa agora, pelo menos no Brasil, será pela renda do consumidor.

“O varejo físico foi praticamente tirado do jogo em 2020. Agora ele volta com os bares, os restaurantes e o turismo. O embate neste ano é com o poder de compra”, afirma Francisco Alvarez, coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas do Varejo da USP.

Neste caso, as perspectivas não são muito animadoras para os comerciantes.

A massa real mensal de salários dos brasileiros, somada com o auxílio emergencial, será quase R$ 10 bilhões menor neste ano na comparação com o ano passado.

As famílias terão cerca de R$ 236,2 bilhões para gastar mensalmente com roupas, eletroeletrônicos, restaurantes, viagens - ou 3,8% menos do que em 2020.

As projeções são da MacroSector Consultores, com base em dados divulgados pelo IBGE.

Após registrar queda de 7% em 2020, o pessoal ocupado até deve crescer neste ano, 1,3%, mas o rendimento médio real mensal deve cair 0,5%, de acordo com a MacroSector.

“A disputa pela renda do consumidor vai ser boa. Em 2020, todo mundo ficou em casa. Neste ano, as famílias começaram a ir para as ruas”, diz Fabio Silveira, sócio-diretor da MacroSector.

Todo o salto de vendas registrado pelo e-commerce, supermercados e lojas de material de construção deve perder folego com a distribuição de consumo em outros setores do comércio.

De abril a agosto deste ano, a circulação de pessoas em regiões comerciais do país aumentou 35%, de acordo com levantamento da CNC (Confederação Nacional do Comércio).

Como consequência, de abril a junho deste ano, de acordo com últimos dados do IBGE, as vendas do varejo subiram 3,5%.

“A circulação de pessoas ainda está abaixo do período pré-pandemia, mas a tendência é que volte à normalidade em um ou dois meses”, afirma Fabio Bentes, economista da CNC.

Bares e restaurantes já começaram a registrar um fluxo maior de pessoas. As agências de viagens também identificaram demanda que chega até a dobrar por pacotes turísticos.

A Abrasel, associação que reúne o setor, prevê aumento de 23% na receita das empresas neste ano na comparação com 2020.

“Os números ainda não chegam aos de 2019, de R$ 235 bilhões, mas caminham para isso, se o país tiver mais estabilidade econômica, política e institucional e se a inflação ficar sob controle”, diz Percival Maricato, presidente do conselho estadual da Abrasel.

Além de uma massa real de salários menor, inflação e juros em alta e taxa de desemprego perto de 15% são outros obstáculos que os lojistas terão de enfrentar nos próximos meses.

Pesquisa realizada pela Abrasel entre os dias 12 e 24 de agosto deste ano identificou que, para 83% dos restaurantes consultados, os custos subiram e, em alguns casos, até mais de 20%.

Como consequência, os preços dos cardápios foram reajustados e, em alguns casos, em 20%.

“A tendência é que alguns setores que não puderam repassar alta de custos para os preços no período das vacas magras, tentem fazer isso agora até para recompor margens”, afirma Bentes.

Uma inflação de custos, como esta que o país vive, não de demanda, diz ele, deve contribuir ainda mais para sacrificar o bolso do consumidor.

Para Alvarez, com ou sem alta de preços, o varejo físico em ruas ou shoppings volta a ganhar folego neste final de ano, assim como está ocorrendo nos Estados Unidos.

“É natural do ser humano se socializar. O consumidor só parou de ir às lojas físicas porque foi obrigado e é esperado que ele volte agora para as ruas com o fim das restrições”, diz ele.

Apesar de a inflação estar em alta, rondando a casa dos 10% ao ano, e juros mais elevados, a oferta de crédito tem se transformado num grande apoio ao consumo.

As operações de crédito para as pessoas físicas devem crescer 16% neste ano em relação ao ano passado.

No caso de recursos para crédito pessoal, a alta deve chegar a 19% e, para aquisição de bens, a 38,8%, de acordo com projeções da MacroSector.

Para contrabalançar um cenário não tão positivo, o movimento de aquisições no setor de vestuário, de acordo com especialistas, é um sinal de apostas importantes no varejo físico.

Recentemente, o grupo Soma, dono de marcas como Animale e Farm, comprou a Hering por cerca de R$ 5 bilhões.

O grupo Arezzo, que já é proprietário das marcas Schutz e Anacapri, adquiriu a marca carioca Reserva por cerca de R$ 700 milhões.

As Lojas Americanas compraram o grupo Uni.CO, dono das redes Imaginaruim e Puket.

“Esses grandes grupos estão apostando no país com projetos de expansão no varejo físico e no on-line”, diz Alvarez.

Para Marcos Hirai, consultor de varejo, o curioso é que os varejistas vivem duas situações distintas neste momento.

Para alguns, há um clima positivo por conta de um aumento de vendas registrado nos últimos 60 dias, com alguns setores atingindo até os níveis pré-pandemia.

Outros empresários ainda estão muito machucados com os impactos das restrições de horário de funcionamento e de circulação de pessoas nas ruas.

“Os varejistas estão com sentimentos divididos. Eles querem crescer, expandir os negócios, mas estão operando com muita cautela neste momento”, afirma Hirai.

A Black Friday, evento que acontece no final de novembro com promoções em praticamente todos os setores, deve ser o termômetro para o final do ano e até para 2022.

“O que já está claro é que o consumidor está diferente na comparação com o período pré-pandemia, quando tinha maior poder aquisitivo”, diz Hirai.

Agora, diz ele, o cliente está mais familiarizado com a internet e com pesquisas. “Este é um momento em que ele vai correr mesmo atrás de preço.”

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